20 de dez. de 2010

O Sacramento do Crisma

Após o batismo segue o sacramento do Crisma (ou Confirmação), do qual podemos tirar motivos para viver justamente, não menos poderosos que aqueles deduzíveis do Batismo; ainda que o Batismo seja um sacramento mais necessário que o Crisma, este é mais nobre que o primeiro. Isto é evidente pelo ministro, a matéria e o efeito.

Ícone bizantino para a Festa de Pentecostes.
O ministro normal do batismo é um padre, ou em caso de necessidade, qualquer um; já o ministro do Crisma é um Bispo, e por dispensa do Papa, somente um padre. A matéria do batismo é a água comum, já o Crisma é  uma mistura de óleo sagrado com bálsamo, consagrado pelo Bispo. O efeito do batismo é a graça e o caráter, como requeridos para criar uma criança espiritual, de acordo com as palavras de São Pedro: Como crianças recém-nascidas desejai com ardor o leite espiritual que vos fará crescer para a salvação (1Pe 2,2). O efeito do Crisma é também a graça e um caráter, tais como necessários para um soldado lutar contra inimigos invisíveis; como diz São Paulo: Pois não é contra homens de carne e sangue que temos de lutar, mas contra os principados e potestades, contra os príncipes deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal (espalhadas) nos ares (Ef 6,12).

No batismo, um pouco de sal é colocado na boca do infante, no Crisma um leve sopro nos é dado, tal que o soldado cristão aprenda a lutar, não pela força, mas pela temperança. Para facilmente entendermos qual o dever de uma pessoa marcada pelo Crisma, ou seja, um soldado cristão devemos considerar o que os apóstolos receberam na sua Confirmação no Domingo de Pentecostes. Eles não foram confirmados com o crisma, mas receberam de Cristo, nosso mais alto sacerdote, o efeito do sacramento sem o sacramento. Receberam três dons: sabedoria, eloquência e caridade, no mais alto grau, e também o poder dos milagres, muito útil para converter nações de pagãos para a verdadeira fé. Estes dons foram significados pelas “línguas de fogo” vistas naquele dia, enquanto o som de um poderoso vento era ouvido ao mesmo tempo. A luz do fogo significa a sabedoria, o calor a caridade, a for de línguas o dom da eloquência, e o vento o dos milagres.

 O sacramento da nossa Confirmação não outorga os dons de falar em línguas  nem o dos milagres, uma vez que eram necessários, não como uma vantagem dos Apóstolos, mas em favor da conversão dos pagãos. Mas nos outorga os dons da sabedoria espiritual e caridade, que são a paciência e gentileza, e como um sinal da mais rara e preciosa virtude da paciência.

O Bispo dá ao crismando um suave sopro para que lembre-se que está se tornando um soldado de Cristo, não para agredir, mas para persistir; não para atacar aos outros, mas para suportá-los. Na guerra dos cristãos, ele luta não contra o visível, mas inimigos invisíveis; para tanto Cristo, nosso comandante e conquistador, foi pregado na cruz e lutou contra as forças do inferno.  Então os apóstolos também lutaram, tão logo confirmados, foram severamente açoitados pelo conselho dos judeus, e saíram de lá cheios de alegria, por terem sido achados dignos de sofrer afrontas pelo nome de Jesus (At 5,41). A graça da confirmação tem este efeito, que um homem injustamente acusado, não pensa em vingança, mas agradece pelo sofrimento.   

Deixemos então que quem tenha sido confirmado entre na câmara do seu coração e diligentemente inquira se tem mantido os dons do Espírito Santo, especialmente a sabedoria e fortaleza. Deixemos que examine, eu repito, se possui a sabedoria dos santos que estimavam os bens eternos e desprezavam os terrenos; se tem a fortaleza de soldados de Cristo, que suporta mais injúrias do comete contra outros. E para que eventualmente não seja engando, deixemos que examine sua consciência. Se entender que está sempre pronto para atos de caridade, não desejando riquezas; e se tiver sido caluniado, pensa prontamente em perdão, não em vingança; pode exultar em seu coração por ter uma alma de filho adotado por Deus.

Mas se, após ter recebido a Confirmação, perceber ser avarento, passional e impaciente; ter dificuldades para distirbuir dinheiro para aliviar a necessidade dos pobres; ao contrário, se ver que está sempre pronto para em cada oportunidade lucrar, pronto para a vingança e não perdoar ofensas, terá ele recebido o sacramento, mas não as suas graças?

O que tenho dito é voltado para quem aproxima-se do sacramento quando adulto. Estes devem permanecer temerosos, para que o pecado não os domine gradualmente, adiando a penitência por um longo tempo, até que extinga-se o espírito recebido, perdendo a graça do Espírito Santo. Assim deve ser entendido o que disse o apóstolo: Não extingais o Espírito (1Ts 5,19). A pessoa exingue o Espírito Santo, que nele habita, destruindo em si mesmo a graça de Deus.

Que, portanto, deseja viver justamente, e após, morrer justamente,  deve estimar profundamente a graça dos sacramentos, que são vasos que carregam tesouros celestiais; e devem estimar estes sacramentos, pois uma vez perdidos, não podem ser recuperados. Assim é com o Crisma, quando recebemos tesouros incomparáveis. Ainda que o caráter deste sacramento não possa ser destruído, este caráter sem as graças não traz nenhum conforto, apenas aumenta nossa confusão.

-- Do Livro A Arte de Morrer Bem, de São Roberto Belarmino, bispo (século XVIII)

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