27 de nov. de 2011

A pobreza verdadeira

Quem realmente deseja entregar-se ao serviço de Deus e levar uma vida espiritual deve, primeirmente, menosprezar e colocar abaixo de seus pés todas as coisas terrenas e mundanas. Destas deve servir-se apenas se forem de primeira necessidade, e mesmo assim, em muito pequenas quantidades, aquilo que não pode deixar de usar para seu ministério, sofrendo com paciência se algo faltar, por amor a pobreza. Como nos diz um doutor: sabemos que não é motivo de orgulho ser pobre, mas é muito grande perfeição, sendo pobre, amar a obreza, as necessidades e misérias que trazem consigo, sofrer-la com muita felicidade e alegria. 

Mas é de chorar que existem muitos que elogiam e dizem amar a pobreza, mas desde que não lhes falte nada para seu proveito. Pintam-se como grandes amigos da pobreza, mas são companheiros apenas de nome. Por que quando podem fogem dos que verdadeiramente padecem e são pobres. Gostam de parecer ser, mas não da fome, menosprezo e abatimento, fiéis companheiras da pobreza. 

Não eram pobres desta maneira nosso fundador São Domingos, e muito menos aquele que sendo o mais rico e poderoso, se fez o mais pobre e mendigo por nós. Os sagrados apóstolos, que nos ensinaram com palavras, nos persuadiram com seus próprios exemplos. A imitação deles, não deves pedir nada para teu serviço, se a isto não te obrigar grande necessidade. E se alguém, movido por sua própria vontade, te quiser dar algo, não aceites nem sejas condescente com teus gostos, ainda que atravesses necessidades ou tenhas intenção de dar aos pobres, para que outros não fiquem com inveja por possuires mais que eles. 

Tão pouco não te mova recebê-lo pensar que quem te envia se entristecerá por não receberes. Por que ainda que caias de prestígio, depois serás motivo para alegria muito grande, não apenas para esta pessoa, mas para qualquer outra testemunha. E teu tão bom exemplo levará, com mais facilidade, a teus irmãos menosprezar o mundo, correr a dar esmolas e ajudar os pobres e necessitados. 

A necessidade que menciono, entendo como a escassez de comida e simplicidade de roupas e calçados, nos quais é muito comum pode padecer. Não chamo de necessidade ter livros, pois ai muitas vezes esconde-se grande avareza, pois nas bibliotecas há muitos livros católicos para nosso estudo. 

Quem quiser ver claramente os maravilhosos efeitos da pobreza, juntamente com os benefícios que lhe seguem, procure com humildade e simplicidade de coração colocar estes conselhos em prática. De outra sorte, se com soberba quiser comtradizer-me e seguir sua própria vontade, seguir por outros caminhos, se encontrará  perdido. Que a verdade é esta, Cristo é o maestro de humildade, aos humildes revela as verdades e segredos divinos, que permanecem escondidos dos soberbos e orgulhosos.


-- Do Tratado da Vida Espiritual, de São Vicente Ferrer - capítulo I. (século XV). 


-- Tradução particular

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