26 de abr. de 2015

Do Martírio do Papa S. Fabiano (236-250 d.C)

Quando era ainda incerta entre nós a notícia da morte desse homem justo, meu companheiro no episcopado, recebi de vós, caríssimos irmãos, a carta que me enviastes pelo subdiácono Cremêncio; por ela fiquei completamente a par da sua gloriosa morte. Muito me alegrei, porque a integridade do seu governo foi coroado com um fim tão nobre.

Por isso, quero congratular-me convosco, por terdes honrado a sua memória com um testemunho tão esplêndido e tão ilustre. Destes-nos a conhecer a lembrança gloriosa que conservais de vosso pastor, que é para nós um exemplo de fé e fortaleza.

Realmente, assim como é um precedente pernicioso para os seguidores e queda que os preside, pelo contrário, é útil e salutar o testemunho de um bispo que dá aos irmãos o exemplo de firmeza na fé.

Mas, parece que, antes de receber esta carta, a Igreja de Roma dera à Igreja de Cartago testemunho da sua fidelidade na perseguição.

A Igreja permanece firme na fé, embora alguns tenham caído, seja porque impressionados com a repercussão suscitada por serem pessoas ilustres, seja porque vencidos pelo medo dos homens. Todavia, nós não os abandonamos, embora tenham se separado de nós. Antes, os encorajamos e aconselhamos a fazerem penitência, para que obtenham o perdão daquele que pode concedê-lo. Pois se perceberem que foram abandonados por nós, talvez se tronem piores.

Vede, portanto, irmãos, como deveis proceder também vós: se corrigirdes com exortações aqueles que caíram, e eles forem novamente presos, proclamarão a fé para reparar o erro anterior. Igualmente vos lembramos outros deveres que haveis de levar em conta: se aqueles que caíram nesta tentação começarem a tomar consciência de sua fraqueza, se se arrependerem do que fizeram e desejam voltar à comunhão da Igreja, devem ser ajudados. As viúvas e os indigentes que não podem valer-se a si mesmos, os encarcerados ou os que foram afastados para longe de suas casas, devem ter quem os ajude. Do mesmo modo, os catecúmenos que estão presos não devem se sentir desiludidos na sua esperança de ajuda.

Saúdam-vos os irmãos que estão presos, os presbíteros e toda a Igreja de Roma que, com a maior solicitude, vela sobre todos os que invocam o nome do Senhor. E também pedimos que vos lembreis de nós.

-- Da Carta que São Cipriano enviou aos presbíteros e diáconos de Roma ao tomar conhecimento da morte do Papa Fabiano (século III)

25 de abr. de 2015

4º Domingo da Páscoa - 26/04/2015

Jo 10,11-18

Naquele tempo, disse Jesus: 11“Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida por suas ovelhas. 12O mercenário, que não é pastor e não é dono das ovelhas, vê o lobo chegar, abandona as ovelhas e foge, e o lobo as ataca e dispersa. 13Pois ele é apenas um mercenário que não se importa com as ovelhas.
14Eu sou o bom pastor. Conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem, 15assim como o Pai me conhece e eu conheço o Pai. Eu dou minha vida pelas ovelhas.
16Tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil: também a elas devo conduzir; elas escutarão a minha voz, e haverá um só rebanho e um só pastor.
17É por isso que meu Pai me ama, porque dou a minha vida, para depois recebê-la novamente. 18Ninguém tira a minha vida, eu a dou por mim mesmo; tenho poder de entregá-la e tenho poder de recebê-la novamente; essa é a ordem que recebi de meu Pai”.
Comentário:
Este é um trecho do discurso sobre Jesus, o Bom Pastor, insistindo, de modo especial, sobre por que Ele é bom: dá livremente sua vida para cumprir a ordem do Pai, que quer a nossa salvação; enquanto procura reunir todos os filhos de Deus dispersos. O reconhecimento de Cristo Bom Pastor não é um simples ato intelectual, mas é experiência e presença (Jo 17, 21-22, 2Jo 1-2) e, por isso, tem sua expressão no amor (Os 6,6, 1Jo 1,3). O Bom Pastor nos permite sermos Filhos de Deus (1Jo 3,1-2). Essa nova realidade que não pode ser compreendida pelos que não reconhecem a Deus abre para a esperança da revelação total daquilo que somos (Rm 8, 29; Fl 3,21; Cl 3,4).
Leituras Relacionadas
Antigo Testamento
Livros Históricos
Livros Sapienciais e Proféticos
  • Oséias 6, 1-6
Evangelhos
  • João 17, 20-26
Cartas
  • Romanoos 8, 28-30
  • Filipenses 3, 17-21
  • Colossenses 3, 1-4
  • 1 João 1, 1-4
  • 1 João 2,29-3,2
  • 2 João 1-2 (capítulos 1 e 2)

21 de abr. de 2015

Isaias 26: O hino depois da vitória

No Livro do profeta Isaías convergem vozes diferentes, distribuídas num amplo arco de tempo e todas colocadas sob o nome e a inspiração desta grandiosa testemunha da Palavra de Deus, que viveu no século VIII a.C.

Dentro deste amplo rolo de profecias, que também Jesus abriu e leu na sinagoga da sua aldeia, Nazaré (cf. Lc 4, 17-19), encontra-se uma série de capítulos, que vai do 24 ao 27, geralmente intitulada pelos estudiosos "o grande apocalipse de Isaías". De fato, encontramos outra, menor, nos capítulos 34-35. Em páginas muitas vezes fervorosas e repletas de símbolos, delineia-se uma poderosa descrição poética do juízo divino acerca da história e exalta-se a expectativa da salvação por parte dos justos.

Muitas vezes, como acontecerá no Apocalipse de João, se opõem duas cidades antitéticas entre si: a cidade rebelde, encarnada nalguns centros históricos daquela época, e a cidade santa, onde os fiéis se reúnem.

Pois bem, o Cântico que agora ouvimos proclamar, e que é tirado do capítulo 26 de Isaías, é precisamente a celebração  jubilosa  da  cidade  da  salvação. Ela eleva-se forte e gloriosa, porque foi  o  próprio  Senhor  que  lançou  as suas bases e os muros de defesa, tornando-a habitação segura e tranquila (cf. v. 1). Agora ele abre de par em par as suas portas para receber o povo dos justos (cf. v. 2), que parece repetir as palavras do Salmista quando, diante do templo de Sião, exclama:  "Abri-me as portas da justiça, desejo entrar para dar graças ao Senhor. Esta é a porta do Senhor; por ela entram apenas os justos" (Sl 117, 19-20).

Quem entra na cidade da salvação deve ter uma característica fundamental:  "Carater firme... confiança em vós... confiar" (cf.Is 26, 3-4). É a fé em Deus, uma fé sólida, baseada n'Ele, que é a "rocha perene" (v. 4).

É a confiança, já expressa na raiz originária hebraica da palavra "amem", sintética profissão de fé no Senhor, que como cantava o rei David é "minha força, minha rocha, minha fortaleza, meu abrigo, meu escudo; meu Deus e meu abrigo em quem me refugio, meu escudo, minha defesa e meu castelo" (cf. Sl 17, 2-3; 2 Sm 22, 2-3).

O dom que Deus oferece aos fiéis é a paz (cf. Is 26, 3), o dom messiânico por excelência, síntese de vida na justiça, na liberdade e na alegria da comunhão.

É um dom recordado com vigor no versículo final do Cântico de Isaías:  "Senhor, proporcionai-nos a paz, porque todas as nossas empresas vós as realizais" (v. 12). Este versículo chamou a atenção dos Padres da Igreja:  naquela promessa de paz eles viram as palavras de Cristo que ressoaram alguns séculos mais tarde:  "Deixo-vos a paz, a Minha paz vos dou" (Jo 14, 27).

No seu Comentário ao Evangelho de João, São Cirilo de Alexandria recorda que, ao dar a paz, Jesus oferece o seu próprio Espírito. Por conseguinte, Ele não nos deixa órfãos, mas permanece conosco através do Espírito. E São Cirilo comenta:  o profeta "invoca que seja dado o Espírito divino, por meio do qual fomos readmitidos na amizade com Deus Pai, nós, que antes andávamos afastados d'Ele devido ao pecado que reinava em nós". O comentário torna-se depois oração:  "Concedei-nos a paz, ó Senhor. Então admitiremos que tudo possuímos, e parecer-nos-á que nada falta àquele que recebeu a plenitude de Cristo. De fato, é plenitude de qualquer bem que Deus habite entre nós através do Espírito (cf. Cl 1, 19)" .

Demos um último olhar ao texto de Isaías. Ele apresenta uma reflexão sobre "o caminho reto" (cf. v. 7) e uma declaração de adesão às justas decisões de Deus (cf. vv. 8-9). A imagem dominante é a do caminho, clássica na Bíblia, como já Oseias, um profeta pouco anterior a Isaías, tinha declarado:  "Quem é sábio para compreender estas coisas, inteligente para as conhecer? Porque os caminhos do Senhor são rectos, os justos andam por eles, mas os pecadores neles tropeçam" (14, 10).

No cântico de Isaías há outra componente, que se revela muito sugestiva também para o uso litúrgico que dele faz a Liturgia das Laudes. Tem-se, com efeito uma menção do alvorecer, esperado depois de uma noite empenhada na busca de Deus:  "A minha alma deseja-vos de noite e o meu espírito dentro de mim busca-vos pela manhã" (26, 9).

É precisamente no alvorecer, quando começa o trabalho e a vida quotidiana já vibra nos caminhos da cidade, que o fiel deve empenhar-se de novo a caminhar "na vereda dos vossos juízos, Senhor" (v. 8), esperando n'Ele e na Sua palavra, única fonte de paz.

Emergem então dos seus lábios as palavras do Salmista, que desde o alvorecer professa a sua fé:  "Vós, Senhor, sois o meu Deus, anseio por Vós. A minha alma está sedenta de Vós... O Vosso amor é mais precioso do que a vida" (Sl 62, 2.4). Com a alma fortalecida ele pode enfrentar o novo dia.

-- Papa João Paulo II, 02 de Outubro de 2002

18 de abr. de 2015

3º Domingo da Páscoa - 19/04/2015

Lc 24,35-48
Naquele tempo, 35os dois discípulos contaram o que tinha acontecido no caminho, e como tinham reconhecido Jesus ao partir o pão. 36Ainda estavam falando, quando o próprio Jesus apareceu no meio deles e lhes disse: “A paz esteja convosco!”
37Eles ficaram assustados e cheios de medo, pensando que estavam vendo um fantasma. 38Mas Jesus disse: “Por que estais preocupados, e por que tendes dúvidas no coração? 39Vede minhas mãos e meus pés: sou eu mesmo! Tocai em mim e vede! Um fantasma não tem carne, nem ossos, como estais vendo que eu tenho”.
40E, dizendo isso, Jesus mostrou-lhes as mãos e os pés.
41Mas eles ainda não podiam acreditar, porque estavam muito alegres e surpresos. Então Jesus disse: “Tendes aqui alguma coisa para comer?” 42Deram-lhe um pedaço de peixe assado. 43Ele o tomou e comeu diante deles.
44Depois disse-lhes: “São estas as coisas que vos falei quando ainda estava convosco: era preciso que se cumprisse tudo o que está escrito sobre mim na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos”.
45Então Jesus abriu a inteligência dos discípulos para entenderem as Escrituras, 46e lhes disse: “Assim está escrito: ‘O Cristo sofrerá e ressuscitará dos mortos ao terceiro dia, 47e no seu nome serão anunciados a conversão e o perdão dos pecados a todas as nações, começando por Jerusalém’. 48Vós sereis testemunhas de tudo isso”.
Comentário:
O trecho do Evangelho tem duas partes bem distintas: na primeira (vv 36-43) Jesus reverte a atitude de incredulidade dos próprios discípulos diante da ressureição de Cristo; a segunda parte (44-47) considera os acontecimentos pascais em seu aspecto salvífico. Devem ser anunciados, entre todos os povoos, como obra de salvação, de modo a obter a conversão e o perdão dos pecados (At 26,17.28; Mt 28, 18-20; Mc 16, 15-16). Cnoclui-se o Evangelho afirmandoo que isto deve se realizar através do testemunho (At 1,8).
Leituras Relacionadas
Antigo Testamento
Livros Históricos
Livros Sapienciais e Proféticos
Evangelhos
  • Mateus 28, 16-20
  • Marcos 16, 14-20
  • João 20, 19-25
Cartas
  • Atos 1, 6-11
  • Atos 10, 34-43
  • Atos 26, 18-20

11 de abr. de 2015

Via Lucis

Via Lucis (Caminho da Luz) é uma forma de devoção que incentiva a meditação sobre a Ressurreição de Jesus Cristo, sendo especialmente válida neste tempo pascal, pois abrange os acontecimentos entre o Domingo de Páscoa e Pentecostes. De maneira intencional, a Via Lucis também tem 14 estações, assim como a Via Crucis, cada estação baseada em uma leitura bíblica. Pode-se acrescentar um breve comentário e cantos a cada estação.

No verão de 1988 o Padre Sabino Palumbieri, professor da Universidade Salesiana de Roma, propos a criação de um novo conjunto de estações a fim de ressaltar a alegria cristã em Cristo Ressuscitado, complementando a ênfase no sofrimento de Cristo proposto pela Via Crucis.

Em Dezembro de 2001, a Santa Sé publicou um Diretório sobre a Piedade Popular e Liturgia, em que comentou sobre a Via Lucis: "através dela os fiéis recordam o acontecimento central da fé - a Ressurreição de Cristo - e seu ensinamento de que em virtude do sacramento pascal, os cristãos passaram da escuridão do pecado para a brilhante luz da graça (Cf Col 1,13; Ef 5,8)".

Ainda não há nenhuma lista universalmente acordada de estações devem compor a Via Lucis, nem a autoridade da Igreja definiu uma. Assim como ocorreu com a Via Crucis, ao longo da história uma lista foi sendo consolidada na experiência de sua oração. Mas, sem dúvida, o número de 14 estações é quase unanimidade. Uma lista muita utilizada é:

  1. Jesus ressuscitado (Mt 28, 5-6)
  2. As mulheres encontram o sepulcro vazio (Jo 20, 1-8)
  3. Jesus aparece a Maria Madalena (Jo 20, 14-18)
  4. O caminho de Emaus (Lc 24, 10-30)
  5. Jesus reparte o pão (Lc 24, 31-35)
  6. Aparição aos discípulos em JJerusalém (Lc 24,36-40)
  7. Jesus dá o poder de perdoar os pecados (Jo 20, 19-23)
  8. A fé de São Tomé (Jo 20, 24-29)
  9. Jesus aparece no mar de Tiberíades (Jo 21, 1-12)
  10. São Pedro reitera seu amor a Jesus (Jo 21, 15-19)
  11. Jesus envia os discípulos (Mt 28, 19-20)
  12. A Ascenção de Jesus (Lc 24, 50-53)
  13. Maria e os díscipulos em oração (At 1,12-14)
  14. Pentecostes, a vinda do Espírito Santo (At 2,1-13)
-- autoria própria

2º Domingo da Páscoa - 12/04/2015

Jo 20,19-31
19Ao anoitecer daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas, por medo dos judeus, as portas do lugar onde os discípulos se encontravam, Jesus entrou e, pondo-se no meio deles, disse: “A paz esteja convosco”.
20Depois dessas palavras, mostrou-lhes as mãos e o lado. Então os discípulos se alegraram por verem o Senhor.
21Novamente, Jesus disse: “A paz esteja convosco. Como o Pai me enviou, também eu vos envio”.
22E, depois de ter dito isso, soprou sobre eles e disse: “Recebei o Espírito Santo. 23A quem perdoardes os pecados, eles lhes serão perdoados; a quem os não perdoardes, eles lhes serão retidos”.
24Tomé, chamado Dídimo, que era um dos doze, não estava com eles quando Jesus veio. 25Os outros discípulos contaram-lhe depois: “Vimos o Senhor!” Mas Tomé disse-lhes: “Se eu não vir a marca dos pregos em suas mãos, se eu não puser o dedo nas marcas dos pregos e não puser a mão no seu lado, não acreditarei”.
26Oito dias depois, encontravam-se os discípulos novamente reunidos em casa, e Tomé estava com eles. Estando fechadas as portas, Jesus entrou, pôs-se no meio deles e disse: “A paz esteja convosco”.
27Depois disse a Tomé: “Põe o teu dedo aqui e olha as minhas mãos. Estende a tua mão e coloca-a no meu lado. E não sejas incrédulo, mas fiel”. 28Tomé respondeu: “Meu Senhor e meu Deus!” 29Jesus lhe disse: “Acreditaste, porque me viste? Bem-aventurados os que creram sem terem visto!”
30Jesus realizou muitos outros sinais diante dos discípulos, que não estão escritos neste livro. 31Mas estes foram escritos para que acrediteis que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e, para que, crendo, tenhais a vida em seu nome.
Comentário:
Este trecho do Evangelho propõe três pontos fundamentais:
1. o poder que Jesus Ressuscitado obteve com a ressurreição é transmitido aos discípulos (Mt 28, 18-20; Lc 24,47; At 26,17-18; 1Cor 15,3.17);
2. a fé é um risco; não se trata de tocar e ver, mas de acolher um anúncio que também é proclamado (1Jo 1,1-5)
3. quando se obtém a fé em Jesus, reconhecendo-o como Cristo, Filho de Deus, tem por consequência obter a vida eterna (Jo 5,24-25)
Leituras Relacionadas
Antigo Testamento
Livros Históricos
Livros Sapienciais e Proféticos
Evangelhos
  • Mateus 28, 16-20
  • Lucas 24, 44-49
  • João 5,24-36
Cartas
  • Atos 2, 42-47
  • Atos 26, 12-23
  • 1Corintios 15, 3-28
  • Pedro 1, 3-9
  • 1 João 1,1-4

3 de abr. de 2015

O poder do sangue de Cristo

Queres conhecer o poder do sangue de Cristo? Voltemos às figuras que o profetizaram e recordemos a narrativa do Antigo Testamento: Imolai, disse Moisés, um cordeiro de um ano e marcai as portas com o seu sangue (cf. Ex 12,6-7). Que dizes, Moisés? O sangue de um cordeiro tem poder para libertar o homem dotado de razão? É claro que não, responde ele, não porque é sangue, mas por ser figura do sangue do Senhor. Se agora o inimigo, ao invés do sangue simbólico aspergido nas portas, vir brilhar nos lábios dos fiéis, portas do templo dedicado a Cristo, o sangue verdadeiro, fugirá ainda mais para longe.

Queres compreender mais profundamente o poder deste sangue? Repara de onde começou a correr e de que fonte brotou. Começou a brotar da própria cruz, e a sua origem foi o lado do Senhor. Estando Jesus já morto e ainda pregado na cruz, diz o evangelista, um soldado aproximou-se, feriu-lhe o lado com uma lança, e imediatamente saiu água e sangue: a água, como símbolo do batismo; o sangue, como símbolo da eucaristia. O soldado, traspassando-lhe o lado, abriu uma brecha na parede do templo santo, e eu, encontrando um enorme tesouro, alegro-me por ter achado riquezas extraordinárias. Assim aconteceu com este cordeiro. Os judeus mataram um cordeiro e eu recebi o fruto do sacrifício.

De seu lado saiu sangue e água (Jo 19,34). Não quero, querido ouvinte, que trates com superficialidade o segredo de tão grande mistério. Falta-me ainda explicar-te outro significado místico e profundo. Disse que esta água e este sangue são símbolos do batismo e da eucaristia. Foi destes sacramentos que nasceu a santa Igreja, pelo banho da regeneração e pela renovação no Espírito Santo, isto é, pelo batismo e pela eucaristia que brotaram do lado de Cristo. Pois Cristo formou a Igreja de seu lado traspassado, assim como do lado de Adão foi formada Eva, sua esposa.

Por esta razão, a Sagrada Escritura, falando do primeiro homem, usa a expressão osso dos meus ossos e carne da minha carne (Gn 2,23), que São Paulo refere, aludindo ao lado de Cristo. Pois assim como Deus formou a mulher do lado do homem, também Cristo, de seu lado, nos deu a água e o sangue para que surgisse a Igreja. E assim como Deus abriu o lado de Adão enquanto ele dormia, também Cristo nos deu a água e o sangue durante o sono de sua morte.

Vede como Cristo se uniu à sua esposa, vede com que alimento nos sacia. Do mesmo alimento nos faz nascer e nos nutre. Assim como a mulher, impulsionada pelo amor natural, alimenta com o próprio leite e o próprio sangue o filho que deu à luz, também Cristo alimenta sempre com o seu sangue aqueles a quem deu novo nascimento.

-- Das Catequeses de São João Crisóstomo, bispo (século IV)

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